Índio, o mais antigo guerreiro tricolor, e o Municipal de 48

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“E Índio teve a sua maior partida no Fluminense. Foi obrigado a um esforço quase sobre humano, porque o Fluminense ficou no primeiro tempo com dez homens e no segundo com apenas nove jogadores contra onze campeões dos campeões sul-americanos. Também quando acabou o jogo Índio não se conteve mais. Deu para chorar como uma criança. O Fluminense obtivera uma das maiores vitórias de sua vida. Índio colaborara para ela, em nenhuma ocasião poderia mostrar melhor a sua dedicação” (O Globo Esportivo, No 511, 1948)

Índio era Aloysio Soares Braga. Nascido em 22 de Maio de 1920, faleceu ontem aos 97 anos de idade. Jogou no Fluminense nos anos de 1948 e 1949 e era, até ontem, o mais antigo jogador tricolor vivo. Na sua passagem pelas Laranjeiras foi titular absoluto na linha média do time que alcançou o terceiro lugar no Campeonato Carioca de 48 e segundo no de 49. Jogou ao lado de tricolores lendários como Castilho, Orlando Pingo de Ouro, Bigode, Píndaro, Didi, Pinheiro e Rodrigues. Mas contar sua história no Fluminense passa necessariamente pela conquista do Torneio Municipal de 1948. Os torcedores mais jovens podem imaginar que se trata de uma conquista de menor importância, mas não foi. Foi um título verdadeiramente sensacional pelas circunstâncias em que foi obtido.

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Índio (Esporte Ilustrado)

O Torneio Municipal era uma espécie de prévia do Campeonato Carioca. Os times que disputavam eram os mesmos. A diferença entre as duas competições é que o Carioca tinha dois turnos enquanto o Municipal apenas um.

Em 1948 o Vasco tinha seguramente o melhor time do Brasil, o famoso “Expresso da Vitória”. Os vascaínos haviam levantado o título carioca de 1947 de forma invicta e em 1948, reforçados do craque Ademir Menezes que buscaram de volta no próprio Fluminense, já haviam conquistado o Campeonato Sul-Americano de Clubes. Com este título importante assegurado o técnico Flávio Costa optou por dar um descanso aos seus jogadores titulares, que passaram a jogar apenas alguns amistosos e torneios enquanto a equipe de aspirantes, chamada de “Expressinho”, disputava o Torneio Municipal.

Mesmo sem sua força máxima o Vasco conseguiu se igualar ao Fluminense nas dez rodadas do torneio. Os dois times terminaram empatados na liderança com 16 pontos, um a frente do Flamengo. O Fluminense ainda teve a chance de assegurar o título na última rodada quando vencia o Botafogo por 1×0 até o último minuto, mas viu a taça escapar por entre os dedos com o gol de empate dos alvinegros.

Foi necessária então a realização de uma melhor de três entre Fluminense e Vasco para decidir o título. O primeiro jogo foi vencido pelo Fluminense com facilidade: 4×0. No segundo o Vasco venceu por 2×1, igualando a série decisiva. Apesar do Fluminense ter feito um placar mais elástico o regulamento da competição não previa desempate por saldo de gols. Em caso de empate no terceiro e último jogo haveria prorrogação de 30 minutos. Se a igualdade persistisse haveriam novas prorrogações de 15 minutos até que saísse um “golden goal”.

A batalha final foi disputada na noite de quarta-feira, 30 de Junho, no estádio de General Severiano. O Maracanã só seria inaugurado dois anos depois e os jogos da melhor de três teriam que ser disputados em campos neutros. O pequeno e simpático campo do Botafogo ficou lotado naquela noite com um público de 14.381 pagantes. Fora os penetras.

Quando os times entraram em campo, a grande surpresa: diferente do que havia feito ao longo de toda a competição o técnico Flávio Costa optou por levar à campo seu time titular. Os jogadores haviam se concentrado em sigilo absoluto e sua presença em campo causou verdadeiro espanto.

O cenário estava montado para uma partida sensacional. Dez dos 22 jogadores em campo estariam na copa do mundo dois anos depois: Barbosa, Ely do Amparo, Danilo Alvim, Ademir Menezes, Friaça, Chico e Maneca entre os vascaínos. Castilho, Bigode e Rodrigues entre os tricolores. No comando das equipes, dois técnicos históricos: Flávio Costa e Ondino Viera.

Não há como negar que ao escalar seus titulares o Vasco passava a ser o grande favorito ao título. Mas com a bola rolando essa superioridade não se confirmou. Mais aplicado e aguerrido em campo, o Fluminense partiu para cima e logo aos 8 minutos abriu a contagem com um gol que ficou marcado por muitos anos no imaginário da torcida tricolor. Rodrigues cruzou da ponta-esquerda e Orlando, o Pingo de Ouro, emendou uma bicicleta espetacular, vencendo o goleiro Barbosa.

O jogo foi muito disputado e até certo ponto violento. Ainda no primeiro tempo o centroavante tricolor Rubinho se contundiu. Como na época não eram permitidas substituições o atacante seguiu em campo, fazendo número. No início da segunda etapa foi a vez do zagueiro Haroldo se machucar. E o Fluminense se viu com dois jogadores inutilizados em campo. Praticamente dois a menos. Haroldo foi deslocado para o ataque e Índio assumiu seu posto na zaga.

Com esse cenário amplamente desfavorável o Fluminense resistiu heroicamente a todas as investidas vascaínas, sustentou o placar de 1×0, e garantiu um dos títulos mais dramáticos de sua história. Uma conquista com a marca de um time de guerreiros.

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Trechos da reportagem do jogo no Jornal dos Sports

Índio havia se casado naquela tarde e seguido diretamente da igreja para General Severiano. Após parar o ataque vascaíno e extravasar na saída de campo sua emoção pela heroica conquista, pôde enfim seguir para sua festa de casamento acompanhado de todos os jogadores campeões. Uma comemoração dupla, e merecida.

Descanse em paz, Índio.

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A Noite

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Jornal dos Sports

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O Globo

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Folha Carioca

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