Títulos

O Bastão de Revezamento e os bastões miniatura do Campeonato Carioca

Uma curiosa premiação outorgada aos clubes campeões cariocas de 1937 a 1973 foi o Bastão de Revezamento. Por iniciativa do Fluminense a premiação foi instituída em 1948. Um belíssimo bastão de prata de posse transitória que passaria das mãos do clube campeão para o campeão seguinte, ano após ano.

A posse definitiva do bastão ficaria com o clube que conquistasse cinco títulos consecutivos ou dez alternados, contando-se a partir de 1937. O motivo da escolha dessa data inicial foi tratar-se do ano de fundação da Federação Metropolitana de Football, ano da pacificação e do fim da cisão no futebol carioca.

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O Bastão de Revezamento, premiação concedida aos campeões cariocas de 1937 a 1973

Os nomes dos campeões de 1937 a 1947 foram gravados no bastão, que foi entregue ao Vasco da Gama, então o atual campeão, no dia 23 de Junho de 1948. A partir daí o bastão foi sendo transmitido ano a ano para o novo campeão, geralmente em cerimônia realizada na primeira partida entre os dois clubes no campeonato subsequente.

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Abertura do Campeonato Carioca de 1961: Fluminense (campeão de 59) x América (campeão de 60). Antes da partida o presidente tricolor Jorge Frias de Paula passa o Bastão de Revezamento para o presidente americano Waldir Motta. Foto: O Globo.

Quando o bastão foi instituído em 1948, sua regulamentação previa ainda que a Federação concedesse uma premiação anual definitiva ao campeão: uma miniatura do bastão. Essa ideia no entanto só foi posta em prática em 1961, ocasião em que a entidade, de uma tacada só, concedeu sete bastões em miniatura ao Fluminense (referentes aos títulos de 1937, 38, 40, 41, 46, 51 e 59), sete ao Flamengo (1939, 42, 43, 44, 53, 54 e 55), sete ao Vasco (1945, 47, 49, 50, 52, 56 e 58), dois ao Botafogo (1948 e 57) e um ao América (1960).

O Fluminense conquistou o direito à posse definitiva do bastão de revezamento em 1971, ano em que alcançou seu décimo título a partir de 1937, porém o regulamento da premiação se extraviou na Federação. Em 1972 e 73 o bastão continuou a ser passado de campeão para campeão, o nome do campeão continuou a ser gravado e os bastões miniatura continuaram sendo concedidos. Apenas em 1974 o Fluminense conseguiu comprovar seu direito à posse definitiva.

Uma curiosidade: o bastão miniatura referente ao título de 1964 nunca foi entregue ao Fluminense. É possível que existam lacunas semelhantes nas premiações aos demais clubes, por falha da Federação.

O Bastão de Revezamento, um prêmio de grande relevância que representa uma era extraordinária do futebol carioca, abrangendo as décadas de 1930 a 1970, está atualmente exposto na Sala de Troféus do Fluminense, assim como os 10 bastões em miniatura que o clube possui, referentes aos seus títulos de 1937 a 1973, exceto 1964.

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O Bastão de Revezamento e os 10 bastões miniatura conquistados pelo Fluminense (1937, 38, 40, 41, 46, 51, 59, 69, 71 e 73). A lacuna é referente ao bastão entregue ao Fluminense pelo campeonato de 1940, que estava em processo de restauração. O Fluminense não recebeu da Federação a miniatura do bastão por 1964

A Federação só passou a entregar regularmente um troféu ao campeão de cada ano na segunda metade da década de 1950. Antes disso, tirando alguns casos isolados, a premiação era feita com troféus de posse transitória. Além do Bastão de Revezamento existiram a Taça Colombo, a Taça Municipal e a Taça AMEA.

A Taça Colombo, o troféu de 1906 a 1919

O primeiro troféu do campeonato carioca foi a Taça Colombo. Ela foi entregue a todos os campeões de 1906 a 1919. Sua posse era provisória e ela ficaria em definitivo com o clube que conquistasse o campeonato três vezes seguidas, feito obtido pelo Fluminense em 1917, 18 e 19. Ela possui esse nome pois foi ofertada em 1906 pela Casa Colombo, importante loja de artigos masculinos da época.

Vale ressaltar que o Fluminense não ficou com a taça em definitivo já em 1908 porque o título de 1907 só foi reconhecido oficialmente décadas depois.

A Taça Municipal, o troféu de 1908 a 1924

Em 1908, a Taça Municipal foi instituída pelo Prefeito da cidade do Rio de Janeiro, Sousa Aguiar. Sua posse era transitória, da mesma forma que a Taça Colombo, mas não havia uma condição para que um clube ficasse em definitivo com ela. A Taça Municipal foi entregue a todos os campeões da Liga Metropolitana de Sports Athléticos (LMSA), de 1908 a 1916, e da Liga Metropolitana de Desportos Terrestres (LMDT), de 1917 a 1924.

De 1908 a 1919, os campeões do Rio receberam portanto a Taça Colombo e a Taça Municipal pela conquista do campeonato. Como a Taça Colombo ficou com o Fluminense em 1919, tudo indica que a Taça Municipal foi o único troféu oficial entregue pela LMDT aos campeões de 1920 (Flamengo), 1921 (Flamengo), 1922 (America), 1923 (Vasco) e 1924 (Vasco).

Em 1924, o Rio teve dois campeonatos. O Vasco, campeão pela LMDT, recebeu a Taça Municipal. O Fluminense, campeão do primeiro campeonato organizado pela Associação Metropolitana de Esportes Athléticos (AMEA), recebeu a Taça AMEA.

Mesmo com o campeonato da AMEA sendo o principal da cidade, a LMDT seguiu organizando seus campeonatos e entregando aos seus campeões a Taça Municipal. Em 1925, o campeão foi o Engenho de Dentro. Em 1932, o S.C. Boa Vista foi seu último campeão. O paradeiro atual da taça é desconhecido.

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O time do Fluminense, campeão carioca de 1908, com as taças Colombo e Municipal. Novamente campeão em 1909, o Fluminense passaria os dois troféus em 1910 ao Botafogo, quando a equipe alvinegra conquistou o campeonato

 

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No detalhe a Taça Colombo, à esquerda, e a Taça Municipal, à direita.

A Taça AMEA, o troféu de 1924 a 1934

A partir de 1924, a AMEA passou a entregar a Taça AMEA, que da mesma forma que a Taça Colombo, seria de posse transitória até que um clube conquistasse um tricampeonato. O Fluminense deteve a taça apenas na conquista do título de 1924 e sua posse definitiva ficou com o Botafogo pelos títulos de 1932, 33 e 34.

Este post foi escrito em parceria com os historiadores Jorge Priori e Auriel de Almeida. Uma versão com mais informações sobre as premiações oficiais do Campeonato Carioca está disponível no blog Historiadores dos Esportes.

Índio, o mais antigo guerreiro tricolor, e o Municipal de 48

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“E Índio teve a sua maior partida no Fluminense. Foi obrigado a um esforço quase sobre humano, porque o Fluminense ficou no primeiro tempo com dez homens e no segundo com apenas nove jogadores contra onze campeões dos campeões sul-americanos. Também quando acabou o jogo Índio não se conteve mais. Deu para chorar como uma criança. O Fluminense obtivera uma das maiores vitórias de sua vida. Índio colaborara para ela, em nenhuma ocasião poderia mostrar melhor a sua dedicação” (O Globo Esportivo, No 511, 1948)

Índio era Aloysio Soares Braga. Nascido em 22 de Maio de 1920, faleceu ontem aos 97 anos de idade. Jogou no Fluminense nos anos de 1948 e 1949 e era, até ontem, o mais antigo jogador tricolor vivo. Na sua passagem pelas Laranjeiras foi titular absoluto na linha média do time que alcançou o terceiro lugar no Campeonato Carioca de 48 e segundo no de 49. Jogou ao lado de tricolores lendários como Castilho, Orlando Pingo de Ouro, Bigode, Píndaro, Didi, Pinheiro e Rodrigues. Mas contar sua história no Fluminense passa necessariamente pela conquista do Torneio Municipal de 1948. Os torcedores mais jovens podem imaginar que se trata de uma conquista de menor importância, mas não foi. Foi um título verdadeiramente sensacional pelas circunstâncias em que foi obtido.

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Índio (Esporte Ilustrado)

O Torneio Municipal era uma espécie de prévia do Campeonato Carioca. Os times que disputavam eram os mesmos. A diferença entre as duas competições é que o Carioca tinha dois turnos enquanto o Municipal apenas um.

Em 1948 o Vasco tinha seguramente o melhor time do Brasil, o famoso “Expresso da Vitória”. Os vascaínos haviam levantado o título carioca de 1947 de forma invicta e em 1948, reforçados do craque Ademir Menezes que buscaram de volta no próprio Fluminense, já haviam conquistado o Campeonato Sul-Americano de Clubes. Com este título importante assegurado o técnico Flávio Costa optou por dar um descanso aos seus jogadores titulares, que passaram a jogar apenas alguns amistosos e torneios enquanto a equipe de aspirantes, chamada de “Expressinho”, disputava o Torneio Municipal.

Mesmo sem sua força máxima o Vasco conseguiu se igualar ao Fluminense nas dez rodadas do torneio. Os dois times terminaram empatados na liderança com 16 pontos, um a frente do Flamengo. O Fluminense ainda teve a chance de assegurar o título na última rodada quando vencia o Botafogo por 1×0 até o último minuto, mas viu a taça escapar por entre os dedos com o gol de empate dos alvinegros.

Foi necessária então a realização de uma melhor de três entre Fluminense e Vasco para decidir o título. O primeiro jogo foi vencido pelo Fluminense com facilidade: 4×0. No segundo o Vasco venceu por 2×1, igualando a série decisiva. Apesar do Fluminense ter feito um placar mais elástico o regulamento da competição não previa desempate por saldo de gols. Em caso de empate no terceiro e último jogo haveria prorrogação de 30 minutos. Se a igualdade persistisse haveriam novas prorrogações de 15 minutos até que saísse um “golden goal”.

A batalha final foi disputada na noite de quarta-feira, 30 de Junho, no estádio de General Severiano. O Maracanã só seria inaugurado dois anos depois e os jogos da melhor de três teriam que ser disputados em campos neutros. O pequeno e simpático campo do Botafogo ficou lotado naquela noite com um público de 14.381 pagantes. Fora os penetras.

Quando os times entraram em campo, a grande surpresa: diferente do que havia feito ao longo de toda a competição o técnico Flávio Costa optou por levar à campo seu time titular. Os jogadores haviam se concentrado em sigilo absoluto e sua presença em campo causou verdadeiro espanto.

O cenário estava montado para uma partida sensacional. Dez dos 22 jogadores em campo estariam na copa do mundo dois anos depois: Barbosa, Ely do Amparo, Danilo Alvim, Ademir Menezes, Friaça, Chico e Maneca entre os vascaínos. Castilho, Bigode e Rodrigues entre os tricolores. No comando das equipes, dois técnicos históricos: Flávio Costa e Ondino Viera.

Não há como negar que ao escalar seus titulares o Vasco passava a ser o grande favorito ao título. Mas com a bola rolando essa superioridade não se confirmou. Mais aplicado e aguerrido em campo, o Fluminense partiu para cima e logo aos 8 minutos abriu a contagem com um gol que ficou marcado por muitos anos no imaginário da torcida tricolor. Rodrigues cruzou da ponta-esquerda e Orlando, o Pingo de Ouro, emendou uma bicicleta espetacular, vencendo o goleiro Barbosa.

O jogo foi muito disputado e até certo ponto violento. Ainda no primeiro tempo o centroavante tricolor Rubinho se contundiu. Como na época não eram permitidas substituições o atacante seguiu em campo, fazendo número. No início da segunda etapa foi a vez do zagueiro Haroldo se machucar. E o Fluminense se viu com dois jogadores inutilizados em campo. Praticamente dois a menos. Haroldo foi deslocado para o ataque e Índio assumiu seu posto na zaga.

Com esse cenário amplamente desfavorável o Fluminense resistiu heroicamente a todas as investidas vascaínas, sustentou o placar de 1×0, e garantiu um dos títulos mais dramáticos de sua história. Uma conquista com a marca de um time de guerreiros.

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Trechos da reportagem do jogo no Jornal dos Sports

Índio havia se casado naquela tarde e seguido diretamente da igreja para General Severiano. Após parar o ataque vascaíno e extravasar na saída de campo sua emoção pela heroica conquista, pôde enfim seguir para sua festa de casamento acompanhado de todos os jogadores campeões. Uma comemoração dupla, e merecida.

Descanse em paz, Índio.

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A Noite

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Jornal dos Sports

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O Globo

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Folha Carioca